quarta-feira, 8 de julho de 2009

A luz de um morto não se apaga nunca!













Da vez primeira em que me assassinaram
Perdi um jeito de sorrir que eu tinha...
Depois, a cada vez que me mataram,
Foram levando qualquer coisa minha...

Hoje, dos meus cadáveres eu sou
O mais desnudo, o que não tem mais nada...
Arde um toco de vela amarelada...
Como único bem que me ficou!

Vinde, corvos, chacais, ladrões da estrada!
Pois dessa mão avaramente adunca,
Não haverão de arrancar a luz sagrada!

Aves da Noite! Asas do Horror! Voejai!
Que a luz, trêmula e triste como um ai,

A luz de um morto não se apaga nunca!

Mário Qintana

Por mais que eu leia esse poema, é difícil absorver e aplicar na vida o ensinamento de que aquele que nada possui, de nada pode ser roubado. E o que muito acumula sofre por medo da perda. Que o melhor é aceitar o fim, desapegar-se e deixar partir. A luz funerária pode ser um fantasma que nos persegue ou a sabedoria que nos ilumina. Asas do Horror! Voejai!

No filme A partida, o protagonista Daigo vive um longo e intenso funeral: a morte do sonho de ser um violoncelista reconhecido. Nessa experiência ele entra em contato direto com a morte e seus rituais, revive o passado para enfim, usufruir do poder transformador das cinzas.

É difícil lidar com términos, ao menos pra mim acontece assim, ainda mais quando se tratam de sonhos. Fazemos de tudo para reviver, para renascer, para reanimar. No entanto, é a simples atitude de aceitar o fim que nos traz a verdadeira paz e conforto.

Que a gente possa enterrar nossos mortos com desapego, na certeza de que fizemos o melhor que podíamos. E, sem se prolongar nos rituais funerários, seguir para a vida.

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P.S.: depois que escrevi o texto acima, fui cuidar de outras coisas e trabalhar em outros projetos. De repente, no meio de um pensamento me veio uma frase muito coerente "já estou há muito tempo maquiando defuntos". E então concluí, com gosto, que tenho essa atividade desde janeiro de 2006! E o filme continua na minha vida, nos meus aprendizados.


2 comentários:

Rob disse...

Um filme fantástico, consegue acompanhar um mergulho na perda, na morte, sem nos carregar junto.

Pedro Tavares disse...

Grande filme.